Homilia da Abertura da Porta da Misericórdia no Santuário de Balsamão | Diocese Bragança-Miranda

Misericórdia sem fronteiras

Balsamão, 17 de Janeiro de 2016

No jubileu da Misericórdia e no Ano da santidade, no 16º encontro de animadores sociopastorais das migrações «Misericórdia sem fronteiras» e na celebração do 102º dia mundial do migrante e do refugiado «Os emigrantes e refugiados interpelam-nos. A resposta do Evangelho da misericórdia», peregrinamos aqui ao monte da Misericórdia onde a Mãe da ternura nos abraça com o Bálsamo na mão e no Espírito Santo atravessa connosco a Porta da Misericórdia sem fronteiras – Jesus Cristo, a Misericórdia do Pai.

Este segundo Domingo do Tempo Comum, o segundo depois da solenidade da Epifania, apresenta-se como uma verdadeira epifania de Jesus, manifestando-se como se manifestou aos Magos em Belém e a João Baptista no Jordão, conforme a intenção da Liturgia, no Ordenamento das Leituras da Missa no Ano C.

  1. O vinho bom da Misericórdia

            O primeiro milagre de Jesus e o seu principal sinal relaciona-se, intimamente, com a sua missão, antecipando a manifestação plena. O contexto é o da festa de um casamento em Caná da Galileia, onde estava a Mãe de Jesus, sendo, também, convidados Jesus e os seus discípulos.

            A certa altura o vinho faltou e Maria disse a Jesus: «não têm vinho». Estranhamente, Jesus responde: «Mulher, que temos nós com isso? Ainda não chegou a minha hora». A hora da realização final ainda não chegou, como se desenvolverá no evangelho joanino, ao aproximar-se a hora da paixão e morte na cruz, ponto culminante de todo o seu mistério e ministério pascal. Todavia, Jesus realiza o milagre, transformando a água em vinho, mas o vinho bom que Ele dá é um sinal do vinho messiânico da sua missão. Maria com mediadora confiança diz aos serventes: «Fazei tudo o que Ele vos disser». Estas são as últimas palavras de Maria no IV evangelho, às quais podemos chamar de seu testamento espiritual.

O vinho ocupa o centro da narração evangélica, referido por 5 vezes. De facto, o vinho no mundo bíblico é símbolo da bênção abundante de Deus e símbolo do Reino que vem. Jesus dá de beber a quem tem sede do vinho novo e bom (DOC) da Misericórdia superabundante.

Certamente que não se pode excluir um simbolismo eucarístico nesta narração das bodas de Caná, porque pela força da Eucaristia a Igreja experimenta na esperança as alegrias das bodas com Cristo.

  1. Igreja, porta aberta

A imagem das núpcias foi usada muitos séculos antes de Cristo, um profeta anónimo, que a Escritura conserva inserido na grade tradição de Isaías, falou da salvação de Jerusalém «… porque serás a predileta do Senhor e a tua terra terá um esposo...tu serás a alegria do teu Deus». O Senhor é, portanto o esposo do seu povo.

A Igreja, gerada pelo Espírito, é uma comunidade unida na diversidade dos membros e das funções, em vista do bem comum e da dignidade inalienável da pessoa humana. O conceito paulino de comunidade funda-se na metáfora simples quanto eficaz do corpo humano. Sucessivamente, Paulo transforma-lhe o significado para falar do corpo de Cristo. O bom uso dos dons do Espírito concedidos à comunidade são para o bem de toda a comunidade e não podem ser ocasião de rivalidade, porque o caminho dos dons espirituais é a caridade.

  1. A resposta da Misericórdia sem fronteiras

Todos os dias somos interpelados por histórias dramáticas de emigrantes e refugiados. Testemunhamos nesta velha Europa um fluxo de refugiados, superior ao da 2ª guerra mundial. A Igreja olha os emigrantes como «irmãos e irmãs que procuram uma vida melhor longe da pobreza, da fome, da exploração e da injusta distribuição dos recursos». O Papa Francisco adverte: «Desde há muito tempo que se poderia ter enfrentado grande parte das causas das migrações; e, deste modo, teria sido possível prevenir tantas desgraças ou, pelo menos, mitigar as suas consequências mais atrozes. E hoje, antes que seja tarde demais, muito se pode fazer para impedir as tragédias e construir a paz». Dar hospitalidade aos nossos irmãos que têm de fugir à morte, à guerra, à fome e facilitar a sua integração com políticas públicas solidárias é a desafiante obra de misericórdia para a humanidade.

Por isso, damos graças a Deus e estamos gratos por todas as iniciativas de acolhimento aos refugiados, na pessoa do Presidente da Cáritas do Líbano, onde ¼ da população é constituída por refugiados.

Hoje é grave a emergência migratória e é um constante desafio ao mundo e à Igreja. Como Maria, somos chamados a ser mediadores de misericórdia e podemos também rezar à fonte da Esperança: «não têm vinho». Ao passar pela Porta Santa da Misericórdia, relembremos que o desafio é de fazer da nossa vida uma vida santa e que a Palavra e a Eucaristia nos encorajem na construção de um mundo mais justo e mais fraterno.

Rezemos e trabalhemos na justiça e na paz, sabendo que «a resposta do Evangelho é a Misericórdia» e «a misericórdia é o coração de Deus», lembrou-o vivamente Francisco na mensagem para o dia mundial da Paz. Sermos inteiros a tempo inteiro, para que Jesus Cristo nos dê a plenitude da alegria e da misericórdia sem fronteiras.           

+ José, Bispo de Bragança-Miranda